Publicação no Jornal O Povo, em 08 de março. Leia aqui
Aos 13 anos, Jaianna Kanindé decidiu voltar pra casa. Em Fortaleza, ela se sentia longe das raízes, uma falta que era até espiritual. Ela comunicou aos pais que queria retornar para a aldeia da Gameleira, no município de Canindé, a 118 quilômetros da Capital. Hoje, aos 27, ela é uma líder dentro e fora da comunidade. Atua no movimento de juventude Kanindé, além de ser uma das representantes dos povos do Ceará na Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste,
Minas Gerais e Espírito Santo.
A mudança, ainda no começo da adolescência, a despertou para lutar por políticas públicas que criem um ambiente econômico e educacional na aldeia. O objetivo é incentivar os indígenas a permanecer, mas também garantir que aqueles que escolham deixar o território tenham os mesmo direitos a acesso a trabalho, educação e cultura.
Entrar na luta indígena, para ela, foi quase como uma obrigação. Quando começou, eram poucos os rostos jovens e femininos em um contexto rural e bem longe das políticas públicas. “O interesse partiu da necessidade de ver que a minha aldeia era pequena e que ela não tinha muita visibilidade. As políticas públicas eram bem escassas aqui dentro. Eu via as lideranças mais velhas já desgastadas do movimento, cansadas, e eu me senti na obrigação de honrar
tudo que eles já tinham feito e tentar dar conti nuidade ao legado”.
Nesses 14 anos dentro de atuação, ela foi vislumbrando outros rostos femininos. Jaian na acredita que há uma diferença quando mulheres levantam as próprias pautas e encorajam outras jovens a buscarem direitos. “Não tem nada mais verdadeiro e mais encorajador do que uma mulher falando daquilo que ela sofre. A violência em casa, a pressão psicológica, todos os assuntos que hoje são pauta, a questão do feminicídio. Quando as mulheres entram em campo para falar sobre isso, traz uma força maior”.
Este ano, ela acredita, é um “marco histórico na luta dos povos indígenas”, com a criação de um ministério, em âmbito federal, e uma secretaria estadual focada nos povos indígenas. Ela destaca ainda que o marco é também pela condução das pastas, lideradas por mulheres indígenas que são membros ativos da mobilização: Sônia Guajajara (Psol), da Terra Indígena Arari boia, e Juliana Alves (PcdoB), também conhecida como Cacika Irê, do Povo Jenipapo-Kanindé. “Antes eram indicações políticas e, muitas vezes, com interesses econômicos. E agora esses órgãos vão ser conduzidos pelos nossos parentes que conhecem a realidade do nosso território”, celebra.
